A PAIXÃO SEGUNDO G.H.
Ou como a grande filosofia pode condensar-se numa pequena barata.
Le Panorama, 1931
“em mim qualquer começo de pensamento esbarra logo com a testa.”
“Toda compreensão súbita se parece muito com uma aguda incompreensão.”
“Minhas previsões me fechavam o mundo.”
“Dar a mão a alguém sempre foi o que esperei da alegria.”
“Não estou à altura de imaginar uma pessoa inteira porque não sou uma pessoa inteira.”
“É como se eu tivesse uma moeda e não soubesse em que país ela vale.”
“O leve prazer geral – que parece ter sido o tom em que vivo ou vivia – talvez viesse de que o mundo não era eu nem meu: eu podia usufruí-lo.”
“(...) quanto a mim mesma sempre conservei uma aspa à esquerda e outra à direita de mim. De algum modo “como se não fosse” era mais amplo do que se fosse (...)”
“(...) treze andares caíam do edifício.”
“A vida (...) é uma grande sedução onde tudo o que existe se seduz.”
La Ruse Symétrique, 1928
“(...) dentro de mim eu já recuara tanto que minha alma se encostara até a parede (...) Eu recuara até a medula de meus ossos, meu último reduto. Onde, na parede, eu estava tão nua que não fazia sombra.”
“A vida é tão contínua que nós a dividimos em etapas, e a uma delas chamamos de morte.”
Portrait de Germaine Nellens, 1962
“A vida se vingava de mim, e a vingança consistia apenas em voltar, nada mais. Todo o caso de loucura é que alguma coisa voltou. Os possessos, eles não são possuídos pelo que vem mas pelo que volta. Às vezes a vida volta.”
“Transcender é uma transgressão.”
“eu quero a actualidade sem enfeitá-la com um futuro que a redima, nem com uma esperança”
“o problema moral em relação aos outros consiste em agir como se deveria agir, e o problema moral consigo mesmo é conseguir sentir o que se deveria sentir?”
“Mas agora, é nesta actualidade neutra da natureza (...) que eu quero saber o amor. E quero saber se a esperança era uma contemporização com o impossível. Ou se era um adiamento do que é possível já (...)”
“Todas as vezes em que não dava certo o que eu pensava ou sentia – é que se fazia enfim uma brecha, e, se antes eu tivesse tido coragem, já teria entrado por ela. Mas eu sempre tivera medo de delírio e erro. Meu erro, no entanto, devia ser o caminho de uma verdade: pois só quando erro é que saio do que conheço e do que entendo. Se a “verdade” fosse aquilo que posso entender – terminaria sendo apenas uma verdade pequena, do meu tamanho.”
“(...) na noite a ansiedade suave de transmite através do oco do ar, o vazio é um meio de transporte.”
“(...) para se ter o incenso o único meio é o de queimar o incenso.”
Le Pélerin, 1966
“(...) era o grande prazer de um não ser o outro: pois assim cada um de nós tinha dois.”
“Agora entendo o que é provação. Provação: significa que a vida me está provando. Mas provação: significa que eu também estou provando. E provar pode se transformar numa sede cada vez mais insaciável.”
“(...) vendera a minha alma para saber. Mas agora eu entedia que não a vendera ao demónio, mas muito mais perigosamente: a Deus. Que me deixava ver. Pois Ele sabia que eu não saberia ver o que visse: a explicação de um enigma é a repetição do enigma. O que És e a resposta é: És.”
“O nome é um acréscimo, e impede o contacto com a coisa. O nome da coisa é um intervalo para a coisa.”
“O presente é a face hoje do Deus. O horror é que sabemos que é em vida mesmo que vemos Deus. É com os olhos abertos mesmo que vemos Deus. E se adio a face da realidade para depois de minha morte – é por astúcia, porque prefiro estar morta na hora de vê-Lo e assim penso que não O verei realmente, assim como só tenho coragem de sonhar quando estou dormindo.”
Les Belles Réalités, 1964
“Se só sabemos muito pouco de Deus, é porque precisamos pouco: só temos d’Ele o que fatalmente nos basta, só temos de Deus o que cabe em nós. (a nostalgia não é do Deus que nos falta, é a nostalgia de nós mesmos que não somos bastante (...))” “Deus é o que existe, e todos os contraditórios são dentro do Deus, e por isso não O contradizem.” Portrait de Stéphy Langui, 1961 “(...) eu não estava à altura senão de minha própria vida.” “Eu tenho à medida que designo – e este é o esplendor de se ter uma linguagem. Mas eu tenho muito mais à medida que não consigo designar. A realidade é a matéria-prima, a linguagem é o modo como vou buscá-la – e como não acho. Mas é do buscar e não achar que nasce o que eu não conhecia , e que instantaneamente reconheço. A linguagem é o meu esforço humano. Por destino tenho que ir buscar e por destino volto com as mãos vazias. Mas – volto com o indizível. O indizível só me poderá ser dado através do fracasso da minha linguagem.”
“Na vida e na morte tudo é lícito, viver é sempre questão de vida-e-morte.”
“(...) minha exigência é o meu tamanho, meu vazio é a minha medida.”
“(...) tudo o que a gente acha bonito é às vezes apenas porque já está concluído. Mas o que hoje é feio será daqui a séculos visto como beleza, porque terá completado um de seus movimentos.
Eu não quero mais o movimento completado que na verdade nunca se completa, e nós é que por desejo o completamos; não quero mais usufruir da facilidade de gostar de uma coisa só porque, estando ela aparentemente completada, não me assusta mais, e então é falsamente minha (...)”
“No entanto esse gosto ruim tinha uma estranha graça de vida que só posso entender se a sentir de novo e só posso explicar de novo sentindo.”
“Agora preciso de tua mão, não para que eu não tenha medo, mas para que tu não tenhas medo.”
“(...) só posso me imaginar pensando e sentindo, dois atributos de se ser, e não me consigo imaginar apenas sendo, e prescindindo do resto. Apenas ser – isso me daria uma falta enorme do que fazer.”
Le Musée d’Une Nuit, 1927